quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

HISTÓRIAS DA VIDA REAL - AS FARÓFIAS DA TIA COSTINHA

Hoje era o dia marcado para publicar fotografias e novidades sobre o último lançamento da Escrita(s) em dia e também sobre a sua primeira internacionalização com expressão verdadeiramente comercial mas a vida, como sabe quem já tem idade para o saber, não costuma fazer pacotes temáticos nem aceita encomendas especiais. Pelo contrário, costuma dar-se a conhecer em verdadeiras embalagens sortidas, com montes de sabores à mistura e hoje, logo pela manhã, chegou-me a notícia de que a Tia Costinha morreu.
Em bom rigor, não se pode dizer que a Tia Costinha me fosse uma pessoa próxima, era tia de um cunhado meu, uma pessoa que conheci não há muitos anos e com quem tive a sorte de privar pontualmente antes de adoecer. Era uma alentejana do Cercal, solteira e bem-disposta, uma doceira de mão-cheia que temperava a generosidade com calda de açúcar e para quem o ex-libris da hospitalidade eram umas farófias que não deixavam ninguém indiferente.
Não é sem alguma vergonha que confesso que, assim de repente, nem me lembro de qual era o primeiro nome da Tia Costinha. Lembro-me, sim - e muito bem - que ela usava óculos com umas lentes que estariam provavelmente entre as mais grossas que já vi na vida. Lembro-me de alguém me ter dito um dia, em conversa familiar à mesa alentejana, que os usava quase desde criança. E sempre me impressionou pensar que aquelas grossas lentes nunca tinham conseguido impedir a Tia Costinha de ver a vida com contornos nítidos e pintada a cores vivas.
Outros terão, com certeza, muito mais para guardar da Tia Costinha e da sua história. A mim, sobra-me essa lição do paladar com que sabemos provar a vida, mesmo quando não nos recebe de tapete vermelho estendido e nos oferece o árido calor alentejano como pano de fundo e uma vida modesta por companhia. A Tia Costinha morreu hoje e estará decerto na estrela cimeira da minha árvore de Natal. Por todas as razões, este Natal pertence-lhe.
Como vos disse, hoje era a data agendada para publicar fotografias e novidades dos últimos feitos da Escrita(s) em dia mas a vida tem um calendário próprio e eu não posso nem quero sobrepor-me a ele. Por isso, as fotografias e as novidades ficam para outro dia. Com a vossa licença, hoje vou dedicar o dia a comer farófias que hoje – e só hoje! – me saberão um nadinha a tristeza.

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