quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

CHÁ COM HISTÓRIAS

Esta foi a primeira estrela no universo luminoso da Escrita(s) em dia e podemos chamar-lhe, com toda a propriedade, uma estrela de Natal: uma caixa de chá com doze histórias diferentes, todas elas milimetricamente concebidas para serem digeridas no tempo que uma caneca demora a beber. O mote foi dado pelas janelas e os textos construídos ao longo das duas semanas que durou a nossa primeira maratona de trabalho.
O Chá com Histórias nasceu em Dezembro de 2008 e é uma caixinha de surpresas onde as histórias se sucedem ao ritmo das canecas de chá, por ordem aleatória, ora tristes e melancólicas, ora brincalhonas e divertidas ou ainda irónicas e imprevistas. Um sortido de histórias, onde decerto encontra uma que lhe sabe especialmente bem... Para saborear, ler e oferecer, no conjunto, individualmente, ou ainda, numa selecção muito pessoal.







As histórias que lhe propomos...
A louca da casa amarela
"Um dia destes, passei por lá e encontrei, pela primeira vez em muitos anos, a janela fechada, as portadas de madeira cerradas por trás dos vidros como uma proibição. A janela nunca mais voltou a abrir-se e o meu caminho para o trabalho nunca mais voltou ao que era dantes."
A casa de Deus
"E porque Deus mandava, eu obedecia. E comparecia à presença do meu pai, mesmo sabendo que enquanto caminhava vinda do fundo da casa, aspirando o calor pútrido do porco que vivia por baixo e lá nos ia aquecendo os ossos nas noites de geada, com a graça do Senhor, ele enrolava a ponta do cinto à mão direita para em mim semear os restos de revolta que não tinha dissolvido no bagaço."
Quando o vulcão falar
"Já andei por todo o lado nesta terra para onde alguém me enviou em quarentena de emoções, e, a pouco e pouco, os lugares têm deixado de ser desertos estéreis de amargura para passarem a ser chão fértil de onde pode, quem sabe, brotar a nova vida. Tenho cansado o corpo e regenerado a alma. E tenho aprendido com esta gente açoreana que carrega consigo a cruz de viver em cima de um vulcão que, quando nada mais é possível, aceitar é a última vitória."
Não sei se já lhe disse
"Onde não há força, não há carga. Se alguma coisa aprendemos com a velhice é a alijar a carga que não presta. Eu fui-me desfazendo de penas e rancores que sempre são o que mais pesa. Já só me restam boas recordações. Como a do meu marido. Morreu ontem, não sei se já lhe disse... Foi esta manhã a enterrar."
As duas irmãs
"Partilharam justamente a velhice dos pais e ambas choraram no funeral com a mesma dor, o mesmo timbre e a mesma expressão agastada e condoída. Iam à missa ao mesmo dia, à mesma hora e confessavam-se ao mesmo padre, até que o padre, para não perder tempo, lhes disse que bastava que uma se confessasse que ele perdoava os pecados a ambas. Bebiam a mesma qualidade de chá e traçavam recatadamente a perna para o mesmo lado."
Um namoro assombrado
"Desta feita, não fomos apanhados desprevenidos e, apurando o ouvido, conseguimos descortinar distintamente, por entre o ruído metálico das correntes, o som arrastado de passos, como se alguém se movesse lenta e dolorosamente sobre as tábuas. A surpresa deve ter alvoraçado a Carolina porque foi ela quem me guiou as mãos a sítios que até aí julgava proibidos."
Fora de moda
"Não foi sequer preciso chegar ao fim da primeira semana de trabalho para perceber que, apesar de continuar a martelar fielmente a sua “máquina a vapor”, a D. Cesaltina não falhava um prazo, não dava um erro ortográfico que fosse, tinha a correspondência em dia e o arquivo mais organizado que certas secções da Torre do Tombo."
Pelo sinal da Santa Cruz
"E Deus me desfira um golpe na cabeça se algum dia alguém desconfiar que sempre que vou a Portalegre, passo na rua do convento e paro à janela do quarto onde dorme a Mariana, sonhando que lhe dispo o hábito engomado, que pelo corpo todo lhe saboreio a pele leitosa de noiva do Senhor e lhe beijo os olhos claros e azuis que um dia hão-de espelhar o Paraíso."
Amoras maduras
"Em Lisboa, eu deitava mãos ao novo ano e barrava fatias grossas de pão branco com doce de amora, avidamente, até se deitar fora o último frasco vazio e eu me esquecer que tinha uma avó na província. Houve um ano em que os meus pais foram comigo. A avó estava doente. Encontrei-a deitada, sem força, quase sem poder falar. E vivi sozinha o tempo que as amoras demoraram a amadurecer."
A herança
"Eu fiquei tão órfão como tinha sido até aí, acompanhado pelos de sempre: uma mãe ausente e um pai envolto numa vaga memória de ódios recozidos. Fiz-me adulto como pude e, de trabalho em trabalho, acabei por chegar a uma empresa onde as coisas correram melhor que de costume e onde fiquei."
Lenço dos namorados
"Trazias o cabelo apanhado numa transsa, o surrizo com que bais ao bailarico e os olhos enxarcados de meiguice. E eu não pude mais do que parar, a olhar p’ra ti como pr’um anjo, assim posta com uma crôa de luar e saia feita da caruma dos pinheiros. Quando por fim me paçaram os maus binhos, curri como lôco a despedir-me, mas já o cumboio tinha partido."
A janela do morbundo
"Vai, Adelina, dá-te ao desfrute, aceita os convites para jantar
e os olhares gulosos dos vizinhos.
Diz que sim a quem te cobiçar.
Se te convidarem para dançar, por Deus, aceita,
abre as pernas quando assim te apetecer
e geme como eu gosto de te ouvir."
E outros pormenores...
Contém 12 saquetas individuais de chá + 12 histórias subordinadas ao tema “Janelas”. Disponível nas variedades Chá de Marrocos e Chá de citrinos (chás da Lipton).
Produto disponível Natal/2009.
Caixa c/ 12 histórias €18
Caixa c/ 1 história à escolha €3,5
Caixa c/3 histórias à escolha €7,5



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